esse é um vaso de planta alucinógena! se certifique de estar em um lugar seguro e se prepare para a brisa
hoje eu acordei ainda mais animado do que o normal, pois dia 20 de março costuma ser um dos meus dias favoritos do ano. como odeio dias quentes, a chegada do outono traz um sopro de ânimo mais do que bem-vindo e não consigo recebê-lo sem um imenso sorriso no rosto. é algo simples, mas que transforma completamente meu estado de espírito.
e, como tá na minha natureza escrever e viajar sobre as coisas simples, pega essa viagem e vem comigo. prometo que vai fazer sentido no final. spoiler: tem uma surpresinha te esperando.
não estamos fora da natureza
com o advento da internet trazendo o mundo inteiro para as telas dos nossos celulares, pensar em natureza parece algo externo, exótico e até perigoso. pensamos em uma floresta densa com animais perigosos, uma savana infinita onde podemos nos perder ou mesmo uma região pantanosa que pode nos engolir no primeiro passo em falso. o curioso é que raramente pensamos naquela espada-de-são-jorge ali no canto da sala que está implorando por um pouco d’água. mais curioso ainda, quando falamos em natureza, dificilmente pensamos em nós mesmos.
não é culpa nossa. vivemos na correria imposta pelo capitalismo (enviou o relatório? atualize o dado na planilha! aproveita que a promoção só dura até amanhã!) e mal temos tempo para respirar, quanto mais fazer essas associações meio malucas que vou propor nesse texto. claro, o fato também de não termos uma lança atrás do guarda-roupa (ou pelo menos espero que você não tenha) para buscar o nosso jantar acaba contribuindo com essa sensação de não pertencimento. hoje o jantar vem até a nossa porta, dá uma buzinada e nosso único trabalho é descer para recebê-lo. se o prédio tiver elevador, o esforço é ainda menor.
acontece que não há humanidade e natureza. é tudo uma coisa só. pra quem sente saudade de estudar conjuntos:
como fazemos parte da natureza, estamos sujeitos as transformações que acontecem ao nosso redor. e elas ocorrem das mais variadas formas.
se você tá curtindo essa brisa, aproveita para se inscrever e receber os próximos vasinhos direto no seu e-mail! (é de graça)
estações da vida
uma metáfora já bem gasta (mas que eu adoro) é comparar a vida humana às estações do ano:
primavera - momento de formação (infancia, adolescência, início da fase adulta)
verão - momento de expansão (~30 aos 50)
outono - momento de contração (meia idade e início da velhice)
inverno - recolhimento (velhice)
é óbvio que a comparação não é perfeita e que cada estação varia de pessoa para pessoa. tem gente que acaba por se encontrar no outono, tem gente que tem uma primavera muito mais intensa do que o verão. mesmo com suas imperfeições, essa analogia mostra que não estamos fora da natureza e que seus ciclos estão entranhados em nós.
como cada estação em nossa vida demora a passar (ainda bem), muitas vezes fica difícil perceber essa mudança. não seja por isso, podemos mudar a perspectiva e ver todo o processo por um outro ângulo, dessa vez, mais pontual.
esse mês eu comecei a estudar piano (eu falo disso nesse vasinho de planta ornamental aqui) e, como todo início, é um processo lento e que demanda tempo até a gente começar a colher os resultados. esse processo é uma primavera. além disso, estou com boas expectativas de bons ventos indicando que a primavera vai acontecer na vida pessoal também 💜
já no fim do ano passado, eu estava em um movimento mais introspectivo e voltado para mim mesmo. precisava pensar e refletir sobre muita coisa. era o meu momento de inverno.
somos compostos de ciclos que, ao contrário da natureza, não seguem uma ordem pré-definida. a bruxaria adora fazer essas relações entre o humano e o ambiente. do mesmo modo que o outono reflete um período de colheita, é um bom momento para nós pensarmos em quais foram as colheitas que fizemos na nossa vida nas últimas estações.
estações e escrita
é óbvio que eu não terminaria esse vasinho de planta sem fazer uma correlação com minha área favorita. a mesma análise (macro e micro) pode ser feita para a escrita. levamos tempo para desenvolver e amadurecer a nossa habilidade em colocar palavras umas na frente das outras. além disso, cada livro que escrevemos pode refletir melhor uma estação. para exemplificar, dá uma olhada no rafaverso:
a menina que se apaixonou pela chuva é uma história da primavera pois mostra o desabrochar da protagonista (e de fato, essa é a estação mais importante pro enredo).
a duologia filhas compõe minhas histórias de verão. ali temos os personagens completamente desenvolvidos e usando do máximo de si para lidar com a situação bizarra.
já não há luz sobre o abismo passa uma vibe outonal, com os moradores sendo obrigados a se recolherem, mas não sem antes encararem os fantasmas do passado.
depois da ultima página é uma história de inverno, pois temos a penny em um movimento cada vez maior em busca de si mesma.
se vc nunca fez essa análise, super recomendo! é uma forma diferente de analisar as suas próprias histórias.
Outonize-se com paciência
para encerrar essa viagem, quero trazer um trecho de um texto do meu poeta favorito. drummond, em um diálogo entre cronista e amendoeira, toca de forma poética nesse aspecto sazonal da nossa vida. se quiser ler o texto na íntegra, só clicar aqui.
— Não vês? [diz a árvore] Começo a outonear. É 20 de março, data em que as folhinhas assinalam o equinócio do outono. Cumpro meu dever de árvore, embora minhas irmãs não respeitem as estações.
— E vais outoneando sozinha?
— Na medida do possível. Anda tudo muito desorganizado, e, como deves notar, trago comigo um resto de verão, uma antecipação de primavera e mesmo, se reparares bem neste ventinho que me fustiga pela madrugada, uma suspeita de inverno.
— Somos todos assim.
— Os homens, não. Em ti, por exemplo, o outono é manifesto e exclusivo. Acho-te bem outonal, meu filho, e teu trabalho é exatamente o que os autores chamam de outonada: são frutos colhidos numa hora da vida que já não é clara, mas ainda não se dilui em treva. Repara que o outono é mais estação da alma que da natureza.
— Não me entristeças.
— Não, querido, sou tua árvore-de-guarda e simbolizo teu outono pessoal. Quero apenas que te outonize com paciência e doçura. O dardo de luz fere menos, a chuva dá às frutas seu definitivo sabor. As folhas caem, é certo, e os cabelos também, mas há alguma coisa de gracioso em tudo isso: parábolas, ritmos, tons suaves… Outoniza-se com dignidade, meu velho.”
fala, amendoeira - carlos drummond de andrade
momento surpresa outonal
para celebrar uma das minhas estações favoritas, meu livro com gostinho de outono, não há luz sobre o abismo, estará gratuito AMANHÃ E SEXTA (21 E 22 de março). se eu fosse você, já deixava ele aberto em uma aba no seu computador/celular para não esquecer ^^
além disso, se quiser uma playlist meio bruxesca para curtir o início dessa estação maravilhosa, só clicar aqui.
muito obrigado por ter separado um tempo para cuidar desse vaso de planta ^^
que a refrescância do outono te ajude a colher os frutos e aprender com tudo o que você viveu nas estações passadas.
compartilhe pra mais pessoas darem carinho a essa plantinha 🌿
até o futuro! 💜🍂
Aprendiz de piano, então?!
Parabéns!!! Adorei receber essa notícia!
Seu texto me fez pensar no livro do Ailton Krenak: A vida não é útil. Ele fala e.xa.ta.men.te do que você fala aqui. É meu livro de prosa de cabeceira. É lindo.
Quanto mais distante de nós mesmos, mais distantes do ambiente né?! Uma coisa leva à outra porque é uma única coisa. rs
Obrigada pelo apoio à Alguma Poesia! Uma honra contar com sua sensibilidade.
Até breve.